Governo Federal assinou nesta sexta-feira, 6 de julho, em Brasília, Medida Provisória para revisar o Marco Legal do Saneamento. Na opinião da ABES, MP pode desestruturar totalmente o setor.
A saúde do povo brasileiro perdeu de 7 x 1 nesta sexta-feira, 6 de julho. Além da lei que flexibiliza o uso de agrotóxicos, em análise pela Comissão Especial do Senado Federal, em plena euforia da Copa do Mundo, o Governo Federal assinou, em Brasília, a Medida Provisória para revisar o Marco Legal do Saneamento.
A Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – ABES alerta que a proposta de revisão do Marco Legal do Saneamento do Ministério das Cidades pode desestruturar totalmente o setor no Brasil. A ABES vem colocando o tema em pauta desde novembro de 2017, quando participou de reunião com o Ministério das Cidades para discutir a revisão. A entidade já havia enviado ao então ministro das Cidades, Bruno Araújo, carta em que sugeria duas ações imediatas ao Ministério. E defendeu, no encontro em Brasília as propostas contidas no documento CONTRIBUIÇÕES DA ABES A MINUTA APRESENTADA PARA ALTERAÇÃO DA LEI 9.984/00 E LEI 11.445/07.
As sugestões dizem respeito a dois aspectos que a ABES considera cruciais:
– o Ministério pretende utilizar medida provisória para a revisão, o que significa fazer uso de instrumento pouco democrático; a ABES propõe alterar a legislação descrita na proposta referenciada por meio do mesmo mecanismo legal, ou seja, Projeto de Lei. A possibilidade de alteração por medida provisória poderá ser considerada ato inconstitucional, enquanto o projeto de lei abre o debate no Legislativo, permitindo a maior participação da sociedade.”
– Artigo 10-A, que trata sobre o chamamento público de antes do contrato programa: a ABES sugere a retirada deste artigo que altera a Lei 11.445 de 05 de janeiro de 2007. Esse artigo aumenta ainda mais a seleção adversa ao interesse público, ou seja, induz as operadoras públicas e privadas a competir apenas por municípios superavitários, deixando os deficitários ao encargo dos municípios e estados. Dessa maneira, dificulta a prestação do serviço de forma regionalizada e, ao dificultar a prática de subsídios cruzados, agrava as diferenças na qualidade e na cobertura dos serviços, com prejuízo para a população mais carente.
“O sonho da universalização do saneamento no Brasil poderá ficar cada vez mais distante. E novamente os mais prejudicados serão os brasileiros mais pobres, que vivem sem acesso a água potável e esgoto tratado e sujeitos a contrair todo tipo de doenças”, adverte o presidente nacional da ABES, Roberval Tavares de Souza.
Além do governo querer utilizar medida provisória para a revisão, em detrimento do projeto de lei, o que significa fazer uso de instrumento pouco democrático, a mesma impactará diretamente no subsídio cruzado (que possibilita que municípios com menos recursos tenham acesso aos serviços).
Para os municípios superavitários, após o chamamento público, haverá invariavelmente interessados e, desta forma, haverá licitação pública. Como há concorrência, o resultado é a otimização do contrato programa local. Todo o superávit que seria gerado na hipótese de contrato de programa tende a ser consumido pelo processo concorrencial da licitação, e desta maneira não subsidiarão os municípios deficitários. Com a aplicação desse processo nos municípios que atualmente são doadores, extingue-se todo o subsídios entre os municípios.
Para os municípios deficitários, por sua vez, não haverá interessados dos agentes, podendo inclusive não haver nem mesmo interesse por contrato programa. O município fica nas mãos do poder público. A fonte de financiamento, nesse caso, deverá ser fiscal.
Dos mais de 5.500 municípios brasileiros, apenas cerca de 500 apresentam condições de superávit nas operações de saneamento. Como ficarão os 5 mil municípios que dependem dos subsídios cruzados? Vamos a um exemplo real: no final da década de 90 o governo do Estado do Amazonas e do município de Manaus, aprovaram que o saneamento de Manaus sairia do controle da empresa estadual de saneamento, o município de Manaus era o único município superavitário do Estado, e o que aconteceu com o saneamento neste Estado?
Não bastando o problema apontado acima, quebra da lógica do subsídio cruzado, observamos que é direito da administração optar pela prestação direta dos serviços de saneamento básico e este artigo pode impedir que uma administração coopere com a outra, levando a ganhos sistêmicos para a sociedade.
“Esta proposta é como se o governo estivesse tirando dos pobres para dar aos ricos, um Robin Hood às avessas dos nossos tempos, digamos, em um momento que recursos para a saúde estão congelados por 20 anos. Ou seja: não investiremos em saneamento para prevenir doenças nem teremos condições de tratar os doentes. Em pleno século 21, viveremos em um Brasil do século 19”, lamenta o presidente da ABES.